*Por Alan Barcellos, coordenador de sistemas Bodytech
Faço trilha desde minha adolescência e comecei a escalar há uns quatro anos.
Decidi nas minhas últimas férias, em março, encarar o monte Roraima, na fronteira entre Brasil e Venezuela, com um grupo de amigos. Veja algumas dicas e como foram os sete dias de aventura.
PREPARAÇÃO:
– É muito importante treinar e se preparar para esse tipo de aventura. No nosso grupo, todos estavam acostumados a fazer trilha, apesar de ser a primeira de longa duração de todos.
– As duas únicas meninas do grupo, porém, nunca haviam feito trilha na vida e escolheram logo o monte Roraima para começar (dá para imaginar o que elas sofreram?). Apesar de todas as recomendações e precauções, como elas não estavam nada acostumadas a esse tipo de atividade (e ambas estavam com botas novas, sem estarem amaciadas para uma jornada dessas), sofreram com bolhas nos pés já no primeiro dia, o que fez com que todo o trajeto fosse um sofrimento ainda maior.
– No meu treino na academia, fiz uma série mais reforçada de perna, trabalhando resistência, e fiz muita “escadinha”, que é o melhor para quem quer ganhar condicionamento de trilha.
– Já no meu treino fora da academia, investi em algumas das trilhas do Rio de Janeiro, como alguns trechos longos da Transcarioca (para acostumar a percorrer longas distâncias e muitas horas de caminhada) e a trilha da Pedra da Gávea, que é só subida e um bom treino para se preparar para o dia em que andamos até o topo do monte Roraima.
AGÊNCIA X GUIAS LOCAIS:
– Fomos com uma agência de turismo de Boa Vista, que é a mais conhecida de lá. Não é necessário fechar com uma agência, mas é preciso ter um guia. Muitas pessoas contratam guias locais e nativos, o que é uma opção muito mais barata, porém não tem o mesmo conforto que é fechar com uma agência.
– Um dia antes de começar o trekking, o pessoal da agência apresenta a programação dos dias, diz o que é necessário levar e qual comportamento que temos que ter na montanha, além de antecipar possíveis contratempos que podem ocorrer.
– Nosso grupo tinha 11 integrantes, mais um guia brasileiro e uma guia venezuelana e cinco carregadores.
O QUE LEVAR:
– Não levamos barraca, pois a própria agência levava, montava e desmontava. Se alguém quisesse usar a própria barraca, eles carregavam sem nenhum custo.
– Você mesmo pode carregar sua mochila ou pagar um carregador para levar as suas coisas. Caso opte por carregar a própria mochila, tome cuidado para não levar muita coisa (mas cuidado para também não levar coisas de menos).
– Caso escolha a opção de contratar um carregador, leve uma mochila menor para ficar com você, pois pode ser que você veja seu carregador no início do dia e só encontre com ele novamente no camping (é importante que você esteja com sua máquina fotográfica, os impermeáveis, o protetor, o repelente e, dependendo do dia, uma roupa de banho).
– Leve saco de dormir, isolante térmico, uma bota impermeável (é importante que ela já esteja amaciada), um casaco impermeável, uma calça impermeável, um saco estanque, uma capa impermeável para o mochilão, uma calça (que vira bermuda) de trekking (levei duas), camiseta para caminhar durante o dia (levei 7 no total, uma para cada dia de trekking), calça e casaco para aguentar até zero grau no cume, uma blusa “segunda pele”, sunga, toalha, gorro, protetor solar, repelente, luva e um chinelo para ficar no camping (se tiver, leve suas Crocs, pois ficar de meia e Crocs no camping à noite é um luxo), garrafa para água e/ou mochila de hidratação.
– Bastão de caminhada: item muito útil, pois ajuda a distribuir o peso e não força tanto os joelhos.
– Atenção: como lá é muito úmido, se suas coisas molham dificilmente secarão novamente (pode abrir um solzão e secar, mas o tempo pode não ajudar e você ter uma muda de roupa seca preparada é sempre bom).
COMIDA:
– A agência oferecia café da manhã, almoço de trilha e jantar. A comida era muito gostosa: comemos pratos locais, como a “arepa” (espécie de polenta frita, crocante por fora e macia por dentro, que era devorada nos cafés da manhã com recheio de queijo), arroz, feijão, bacalhau, carne, linguiça, frango, macarrão, sopa, tudo com o tempero de pimenta com cupim (isso mesmo, cupim) levado por nossa guia venezuelana.
– Uma noite, quando já estávamos no cume e estava mais frio, voltamos para o nosso “hotel” (as áreas de acampamento no cume são chamadas de hotel, pois ficam em pequenas grutas) tinha chocolate quente e pipoca nos esperando.
– Só levamos pequenos lanches de trilha, como barrinha, mix de cereais, bananada, algum chocolate…
– Não é necessário levar mais de um litro de água, pois existem rios e córregos com água potável de hora em hora ao longo de todo caminho.
BANHEIRO:
– Eles levam uma espécie de banheiro, que é uma barraca vertical com um formato similar ao de um banheiro químico. Dentro fica um banco de plástico com um buraco no meio para você colocar um saco plástico (fornecido por eles) e fazer suas necessidades. Quando acaba, eles têm ao lado da barraca cal para colocar dentro do saco e um álcool em gel para você higienizar suas mãos.
– Esse esquema de banheiro tem como objetivo causar o menor impacto possível nas áreas de camping, portanto eles trazem todos esses dejetos de volta.
A TRILHA – DIA 1:
– A trilha começa pelo lado da Venezuela, então saímos às 5h para ir de van de Boa Vista (Roraima) até Santa Elena de Uairén (já na Venezuela), que fica a umas duas horas e meia de estrada.
– Nesse trajeto passamos pela Polícia Federal brasileira e pela aduana venezuelana, onde é necessário mostrar o passaporte ou a identidade, além da carteira da Anvisa de vacinação contra febre amarela (o comprovante de vacinação muitas vezes não é pedido, mas não vale a pena arriscar. E o passaporte é mais seguro que a identidade, mesmo a Venezuela sendo membro do Mercosul).
– De lá trocamos para uma caminhonete 4×4 para percorrer mais 68 km até a comunidade indígena de Paraitepuy, localizada no Parque Nacional Gran Sabana, onde chegamos por volta de 12h30, almoçamos e começamos a trilha.
– Chegando a Paraitepuy, que fica a 1.300 metros de altitude, caminhamos cerca 15 km até o rio Tek.
– No primeiro dia, a caminhada é bem tranquila: algumas subidinhas e descidinhas e muito plano.
– O acampamento possui umas casas de pau-a-pique, com mesa de madeira onde conseguimos sentar para fazer as refeições.
– Como o rio Tek fica ao lado, é um dia com um bom banho.
– O único incômodo são os puri puri, que são uma espécie de mosquitinhos bem chatinhos (porém, suas mordidas não coçam, caso você não seja alérgico).
A TRILHA – DIA 2:
– Fomos do rio Tek (1.100 metros de altitude) até a base do monte Roraima (1.850 metros) em uma trilha de aproximadamente uns 4,5 km.
– Nesse dia, a caminhada, mesmo sendo mais curta, é mais pesada, pois cerca de 70% do percurso é de subida.
– Começamos o dia atravessando o rio Tek e logo depois (cerca de 1 km) atravessamos o rio Kukenan. É preciso bastante atenção nessas duas travessias: o aconselhável é fazê-las usando apenas meias, pois temos que pôr os pés na água e ir pisando de pedra em pedra, que são bastante escorregadias. Assim, a meia dá uma aderência melhor às pedras.
– A “estrutura” do camping já é outra: apesar de ter algum esqueleto de casa de madeira com cobertura de lona, já não temos mesas e bancos.
A TRILHA – DIA 3:
– Andamos aproximadamente 4,5km, da base do monte Roraima (1.850 metros) até o topo (2.734 metros).
– A subida é mais forte, mas, ao mesmo tempo, bastante recompensadora, pois passamos por alguns mirantes de onde pudemos apreciar a vista e tirar boas fotos
– É preciso ter bastante atenção ao passar pelo “passo das lágrimas”, que é o trecho onde passamos sob uma cachoeira: além de as pedras serem bem escorregadias (por estarem molhadas), tem muita pedra solta. Por isso é bom dar uma distância de segurança entre os caminhantes.
– Chegando ao topo fomos até nosso “hotel”, que era o Guacharo, grutas que abrigam mais de 15 barracas e protegem do vento e da chuva, com bons pontos para esticar varal e mesa para comer e cozinhar. Passamos 3 noites lá para depois descermos.
A TRILHA – DIA 4:
– Nosso primeiro dia de passeio no cume, onde andamos quase 24 km.
– Passamos pelo vale dos cristais e andamos até o ponto triplo (fronteira entre Brasil, Guiana e Venezuela).
– De lá fomos até o El Foso, que, como diz o nome, é um grande buraco com quedas d’água em uma de suas laterais: é possível entrar dentro dele por uma trilha e nadar em suas águas geladas.
– Voltamos para o hotel para descansar até o dia seguinte.
A TRILHA – DIA 5:
– Saímos do hotel e fomos até o Salto Catedral, uma cachoeira que passa a sensação de estar dentro de um santuário.
– De lá fomos para o mirante La Ventana, onde é possível admirar a imponência do Monte Kukenan (“tepuy” que fica ao lado do monte Roraima).
– À tarde, já depois do almoço, fomos a uma gruta que fica a 5 minutos do “hotel”: é possível caminhar por mais de 40 minutos no interior dessa gigante caverna, cujo interior exploramos tempo suficiente para conhecer suas enormes galerias.
– Antes de voltar para o hotel, finalizamos o dia com uma parada nas “banheiras de hidromassagem”, piscinas naturais onde tomamos um bom banho.
– Nesse dia andamos cerca de 5 km.
A TRILHA – DIA 6:
– Fomos do topo (2.734 metros) até o acampamento do rio Tek (1.100 metros): são 15 km só de descida, o que foi bem desgastante em função do impacto no joelho.
A TRILHA – DIA 7:
– No último dia fomos do rio Tek (1.100 metros) até o final/início da trilha, que fica em Paratepuy (1.300 metros).
– Andamos 15 km nesse dia que foi mais puxado do que o primeiro dia, pois agora era mais subida do que descida.
– De lá pegamos a 4×4 até Santa Elena de Uiarén, trocamos para a van e voltamos até Boa Vista.