*Por Caroline Domingues
Poucas coisas do universo outdoor são tão perigosas quanto navegar num barco a vela em alto-mar — e isso por boas razões. Quem se arrisca assim precisa agir estrategicamente para enfrentar temperaturas entre 5ºC e 40ºC, superar o drama das tempestades, eventuais falhas técnicas e lidar com a ansiedade e a restrição de sono (isso se você não quiser ser pego de surpresa por uma onda gigante). É por essas e outras razões, talvez, que mais pessoas tenham visitado o topo do Monte Everest, a mais alta montanha do mundo (8.848 metros de altitude), na Cordilheira do Himalaia, do que cruzado nossos desconhecidos oceanos.
Os tripulantes das sete embarcações que partiram da cidade de Alicante, na Espanha, em 4 de outubro, para dar início à 12ª edição da Volvo Ocean Race 2014-2015, a mais longa e desafiadora regata do mundo, conhecem bem esses riscos — e até outros.
A VOR, como a regata popularmente é conhecida, terá nove meses de duração, passará por 11 países espalhados pelos quatros continentes e percorrerá 38.739 milhas náuticas (algo como 71.745 mil quilômetros) em nove etapas, ou pernas, como é dito na vela. Só para ter uma ideia, o caminho percorrido é o equivalente a duas vezes a circunferência do planeta Terra.
Depois da largada na cidade espanhola, os times seguiram confiantes até Cape Town, na África do Sul. De lá, saíram no dia 15 de novembro a caminho de Abu Dhabi (Emirados Árabes), passando por Sanya (China) e Auckland (Nova Zelândia), onde darão início à etapa mais longa e arriscada do evento: serão 6.776 milhas náuticas até a praia de Itajaí, em Santa Catarina (Brasil).
As embarcações ainda continuam a jornada para Rhode Island (Estados Unidos), cruzam o Oceano Atlântico até Lisboa (Portugal), Lorient (França), fazem uma parada de 24 horas em Haia (Holanda) até, finalmente, cruzar a linha de chegada, em Gotemburgo (Suécia) — porto em que será realizada a cerimônia de encerramento da longa regata, com previsão para acontecer em 27 de junho de 2015.
Parada no Brasil
A escolha das cidades portuárias que sediam a maior regata tripulada do mundo é feita pensando na rota e nos aspectos políticos. O Brasil está no mapa da VOR desde 1997 e já teve stopovers (cidades-sede) em São Sebastião (SP) e no Rio de Janeiro (RJ).
“A prova é desgastante e muito difícil, principalmente até nos adaptarmos à rotina dentro do barco, que costuma ser bem cansativa e incluir intervalos muito curtos de sono. Além disso, precisamos estar sempre prontos para as funções que surgirem”, comenta o único brasileiro escalado para a competição deste ano, André Fonseca, que recebe o apelido de “Bochecha”. Aos 36 anos de idade, este catarinense participou da Volvo Ocean Race em duas ocasiões: em 2005-2006, quando correu a regata com a equipe Brasil 1 (primeiro e até hoje único barco brazuca na VOR), e em 2008-2009, quando integrou o time Delta Lloyd.
No vasto currículo de André, ainda estão participações interessantes nos Jogos Olímpicos de Atenas (2004) e de Pequim (2008), quando competiu na classe 49er. É com essa rica experiência no esporte que ele encara sua terceira participação na maior regata do mundo como chefe de turno da equipe espanhola Mapfre.
“Para participar da Volvo Ocean Race é obrigatório passar por um curso de alto nível, realizado na Inglaterra. Claro, acidentes acontecem, no entanto, contamos com velejadores bastante experientes e preparados. Mas os novos projetos de barcos da competição também estão cada vez mais seguros.”
Para percorrer tantos quilômetros, durante tanto tempo, as equipes devem possuir embarcações levíssimas e resistentes, capazes de enfrentar com bravura os mais diversos perigos dos mares. Por isso, os barcos da Volvo Ocean foram construídos de forma idêntica pela empresa sueca de design Farr Yacht Design e não podem de jeito algum ser modificados pelas equipes.
Diferentemente da última edição, desta vez, o barco de classe 65 é um pouco menor que o da versão anterior, mas ainda segue robusto, veloz (ele alcança até 75 quilômetros por hora) e luxuoso — cada barco requer investimento de 15 milhões de euros. “Como os barcos são iguaizinhos, não existe vantagem e cada equipe precisa pensar em detalhes no planejamento se quiser vencer”, conclui André.
O prazer da vitória
Das sete equipes que integram esta edição (Abu Dhabi Racing, Alvimedica, Brunel, Dongfeng Race Team, SCA, Mapfre e Vestas Wind), vence aquela que chegar mais rápido ao maior número de portos. Depois de tanto esforço, não existe nenhuma recompensa financeira para o vencedor. O prêmio para o campeão é a honra e o status de conquistar a Volvo Ocean Race, a regata mais difícil do mundo, que integra a lista das principais provas de vela, ao lado da America’s Cup e dos Jogos Olímpicos.