Completar uma maratona não é só alegrias. Dores também fazem parte da prova. E o mais incrível é que, mesmo depois de câimbras e dedos sangrando, o maratonista que acabou uma corrida não pensa duas vezes ao se inscrever em uma próxima.

Segundo reportagem do jornal “New York Times“, o estudo “Memória da dor induzida pelo exercício físico” (em tradução livre) mostra por que alguns maratonistas parecem desenvolver uma amnésia seletiva, esquecendo, depois de algum tempo, quanta dor eles sentiram nos 42km da maratona.

Mas essa lembrança depende de quanto a pessoa aproveitou a experiência. A psicologia explica que a sensação da pessoa durante o momento em que o dano ou a dor acontece, ou seja, o contexto emocional, influencia na sensação de sofrimento. Em geral, a dor associada a uma experiência positiva tende a ser percebida como menos forte do que a que surge de algo não tão prazeroso.

Nossa memória é influenciada pelo significado da dor. Essa foi a conclusão de outro estudo que questionou o grau da dor de mulheres que tinham acabado de dar à luz ou passado por uma cirurgia ginecológica. Logo após a intervenção, o nível de dor em ambos os casos era alto. Seis meses depois, aquelas que tinham passado pela cirurgia disseram que a dor era muito mais alta do que o que tinham relatado logo após a operação, enquanto as que tinham dado à luz acharam que a dor era muito menor –isso para casos de partos normais. As mães que passaram por cesarianas tinham lembranças mais precisas.

O estudo sobre os maratonistas surgiu porque completar uma longa prova de corrida é extenuante, mas também pode ser um momento de alegria intensa. Ou seja, combina dor objetiva com emoção subjetiva.

Para pesquisar isso, o professor de psicologia Przemyslaw Babel, da Jagiellonian University, na Cracóvia (Polônia), autor do estudo, usou um método simples. Ao final da Maratona da Cracóvia, em 2012, pediu que 62 maratonistas dessem uma nota para a intensidade da dor e quão desconfortante ela era naquele momento, assim como seu estado emocional. Os corredores, em geral, classificaram uma intensidade moderada de 5.5 numa escala de 0 a 10.

Três e seis meses depois foi solicitado aos mesmos corredores que classificassem a dor que sentiram ao final daquela mesma corrida. As memórias se mostraram bem diferentes. O número caiu para 3 numa escala de zero a 10. É interessante ressaltar que os corredores que afirmaram terem se sentido menos felizes na corrida, em geral, lembraram a dor mais precisamente do que aqueles que tiveram mais alegria ao terminar a corrida, mesmo que a dor de ambos tenha sido parecida na primeira descrição.

O estudo foi de curto período e limitado, envolvendo apenas maratonistas e não controlando idade, experiência, saúde em geral, personalidade e outros fatores. Mas as descobertas “ajudam a explicar por que pessoas correm maratonas diversas vezes apesar da dor causada pela experiência física”, afirma o professor.

A amnésia seletiva associada a uma maratona poderia ter uma base evolucionária, o pesquisador afirmou, já que humanos corriam para sobreviver e podem ter precisado desconsiderar alguns dos desconfortos disso.

A pesquisa também sugere que não se divertir pode deixar mais “afiada” a lembrança da dor, o que faz com que ela não seja motivadora. Então, se você quer manter um exercício ou um programa de competição e também esquecer das dores, encontre uma atividade de que você goste.