*Por Caroline Domingues para a revista “BT Experience”

O desafio pode ser grande, mas calma, porque a ultramaratona não é um bicho de sete cabeças, feita só para atletas profissionais ou “super-heróis”. “O primeiro passo para quem quer participar de uma prova de longa distância é acreditar que é capaz. Depois, basta escolher uma travessia que inspire você de todas as maneiras”, explica a atleta Cristina Carvalho (seis vezes campeã do El Cruce Columbia) e treinadora da assessoria esportiva Núcleo Aventura. Segundo Cristina, se uma pessoa já realiza exercícios periodicamente, doze semanas é o tempo necessário para estar pronta para um ultradesafio. Por outro lado, se a pessoa é sedentária ou possui alguma restrição física, o período de preparação é de pelo menos um ano.

Participar de uma ultramaratona é, com certeza, um passo importante na vida do corredor, mas a decisão vem recheada de coisas boas: além de tornar-se uma missão divertida, por exemplo, de tentar concluir, no prazo de uma vida inteira, os dez desafios propostos pelo UTWT — ao se inscrever em uma prova de longa distância, você tem a chance de correr por lugares belíssimos e pode ainda conferir os grandes nomes da modalidade em ação, como o espanhol Kilian Jornet. Aos 27 anos, ele é atualmente o maior vencedor das corridas de montanha de longa distância.

Glórias à parte, a verdade seja dita: como em toda modalidade, é preciso cuidado para evitar lesões. Os ultramaratonistas fazem parte do grupo de corredores que mais perdem tempo de treinamento devido a lesões (quase 70%).O erro mais comum entre os novatos deste universo é o volume de treino. “As pessoas precisam entender que existe um limite para cada um em relação à assimilação do treinamento físico e, portanto, tudo que estiver acima dessa capacidade vai, em vez de agregar, consumir a condição física e comprometer o desafio”, explica Cristina. “Precisamos buscar qualidade no lugar de quantidade e estabelecer parâmetros que avaliem a assimilação dos treinos.”

ultramaratona preparação

BONS RESULTADOS

Incluir outros tipos de treinamento em uma planilha (que deve ser montada por um profissional qualificado, é claro!) também pode ajudar a atingir os resultados desejados. Um treino de fortalecimento muscular dos membros inferiores e superiores é importante. Muitos corredores de longa distância não têm afinidade com esse tipo de treinamento, porém, cada vez mais as pesquisas mostram que o preparo muscular pode tanto melhorar a performance quanto a economia de energia, além de auxiliar na prevenção de lesões”, explica o professor-doutor Carlos Pinfildi, da Universidade Federal de São Paulo.

Para Fernanda Maciel, a combinação é perfeita. “Meus treinos variam de 15 a 25 horas semanais. Também pratico bike speed no verão e, no inverno, esqui de montanha e escalada”, conta. “É muito importante ter outros esportes que gostamos para nos ajudar a progredir, não sofrer tanto impacto nos joelhos, tornozelos e pés, membros que a corrida exige muito”, completa a atleta, que acumula bons quilômetros com “extracompetições”, como o projeto White Flow. Nele, Fernanda corre ao mesmo tempo que promove uma ação social: propõe um desafio a várias entidades para arrecadar fundos e ajudar crianças com câncer. Nesse caso, ela voou até Santiago de Compostela, na Espanha, e correu os 900 quilômetros do Caminho (trilha para peregrinos) em dez dias. O desafio foi concluído com sucesso e o dinheiro foi direcionado às crianças.

Dicas para evitar lesões em ultramaratonas

MAIS CEDO OU MAIS TARDE?

Uma polêmica cabeluda também cerca o universo dos ultramaratonistas: as corridas de longa distância são, ou não, provas para corredores mais velhos? Para as atletas Fernanda e Manuela, a vantagem que o corredor mais velho leva sobre o iniciante é a experiência. “A ultra é um esporte para o corredor que já acumulou muitos quilômetros na vida, porque só assim ele poderá realmente aproveitar 100% da sua performance, do seu conhecimento mental, não se lesionar e voltar para casa com uma experiência bonita e valiosa”, comenta Fê Maciel.

Se para as atletas os corredores com currículos recheados possuem essa vantagem, para Cristina, que já viu e treinou inúmeros “novatos de ultra” com o planejamento certo e o acompanhamento de profissionais qualificados (isso inclui também um bom nutricionista), a experiência pode ser inesquecível. “A regra está mudando: a corrida vem atraindo mais jovens, porque correr é maravilhoso, amplia totalmente nossos horizontes. A ultra foi feita para todos que gostam e se determinam a fazer”, diz a coach. “Eu nunca tinha corrido mais que 21 quilômetros e resolvi me inscrever no El Cruce por diversão. Foi a melhor coisa que fiz. Treinei certinho e dei meu melhor, mas vi muita gente ficar pelo caminho”, lembra Lucas Franceschini, 25 anos, jornalista e corredor. “Meu objetivo era começar o ano tirando um item da minha lista de ‘coisas para fazer antes de morrer’ e foi o que eu fiz”, conclui, sentindo-se pronto para encarar qualquer piramba que apareça à sua frente.

 

Créditos das fotos: © CEZSART PHOTO / DIVULGAÇÃO